31.5.05

Resposta ao Poeta


Aquele Bruxo-jardineiro é alguém que trago em meu coração e que foi o semeador de grande parte do que hoje eu sou e ainda serei. Poderia ser minha alma gêmea se dependesse só de mim essa escolha, mas não tenho a pretensão de afirmar nem desejar isso, visto a grandeza de sua alma e por saber que ele é alma gêmea de patrimônio universal. Assim, não tenho direito a essa exclusividade. Já posso me considerar muito feliz por ter desfrutado de sua convivência por 16 anos de minha vida ( dos 20 aos 36 anos) e por ter recebido de seu coração amoroso atenção, carinho e muitas, muitas palavras que me mostravam coisas de mim que desconhecia, coisas da vida que me eram totalmente estranhas e que foram fundamentais em meu processo de crescimento e amadurecimento como pessoa. Ele me ensinou que o mais importante nessa vida é estarmos sempre dispostos a aprender, a abandonar conceitos que se tornaram dispensáveis quando outros novos nos acenam com mudanças para melhor em nossas vidas; que precisamos ouvir a voz de nossa alma sempre que ela tiver algo a nos comunicar sobre mudanças de rotas e que precisamos nos desapegar de tudo que possa nos impedir de seguir o caminho de nossa evolução. Ele me ensinou muitas outras coisas que só agora estou tendo condições de entender e colocar em prática. Como você pode ver, apesar de já estar no andar de cima há nove anos, ele ainda continua comigo a cada dia através do que me ensinou. Por isso, sempre que penso nele, ou que bate uma saudade de sua presença física junto a mim, as lágrimas vêm para tentar aliviar essa emoção que aperta o coração e faz extravasar a dor que sinto por não poder ver seu sorriso cativante, seu olhar acolhedor e amoroso que me dava uma sensação de ter um anjo encarnado sempre ao meu lado. Creio que poderia até escrever um livro sobre o “meu” bruxo jardineiro, pois quando começo a falar sobre ele não quero mais parar. Creio que é uma forma que encontrei de reviver todos os momentos que passei ao lado dele, senti-lo mais próximo e, assim, poder diminuir a saudade. Acho que já deu para você conhecer um pouco do meu mestre-amigo-pai-bruxo jardineiro Olavo! Acho que já deu pra você notar o quanto amo esse homem, o quanto respeito essa alma abençoada que me abriu novos horizontes e me despertou a sede de auto conhecimento que tem norteado meu caminho desde então.
Quanto ao outro assunto, não é loucura não, Poeta! É pura constatação! Volte sua fita e veja quando foi que conversamos como nas primeiras vezes? Quantas vezes você me deixou falando sozinha sem ao menos dizer: Lili, não gostei do que você falou, ou não concordo com o que você disse? O que tem acontecido é que sempre que falo algo que você não concorda, você simplesmente se fecha e se retira da conversa. Confesso que fico triste sempre que isso acontece. Em minha vida, principalmente quando criança e adolescente, sempre deixei de expressar a minha verdade para ser aceita por meu pai, para ter o seu amor, que para mim, era muito importante. Para me sentir amada fui tendo que colocar a Liliane verdadeira no fundo de um baú e impedir que ela se manifestasse. Foi uma escolha que fiz e era a única que achava viável para sobreviver. Não guardo raiva de meu pai por isso e sei que ele agia da única forma que sabia e como foi “ensinado”, sei que, do jeito dele, me amava e queria o melhor para mim e sei que não saberia agir de outra forma. Hoje compreendo perfeitamente e, por isso, estou tentando mudar e deixar a Liliane que ficou guardada a sete chaves, ir dando o ar de sua graça e se expressar de forma verdadeira e sem medos. Assim, quando falo abertamente e alguém simplesmente rejeita o que disse sem ao menos me dizer algo, sinto-me como se a Liliane que se fechou tivesse me dizendo: tá vendo porque escolhi não expressar a minha verdade? Porque sempre que isso acontece sou rejeitada! Mas ser eu mesma é minha meta de agora em diante e mesmo sofrendo nesses momentos, não vou desistir de falar as coisas que acredito. Também não quero que a minha verdade seja aceita por quem dela não compartilha, apenas quero ser respeitada em meu direito de ser eu mesma, assim como respeito cada um com sua própria verdade. Tenho conseguido ser eu mesma com algumas pessoas, pois estabelecemos que sempre que algo nos desagradasse chegaríamos junto e colocaríamos isso em discussão expondo cada ponto de vista como algo sagrado que deva ser acolhido e respeitado. Devo dizer que isso não é fácil pois requer deixarmos nosso ego de lado, sermos desprendidos da necessidade de estar sempre certos e sermos infalíveis.
O que está ocorrendo é que parece que estou sempre tocando em suas feridas e como reação você se fecha para não sentir a dor que isso provoca. Digo isso, porque já fiz muito e ainda repito algumas vezes esse comportamento. Lembra que lhe falei que você é um espelho? E entre espelhos há sempre esse tipo de choques. Mas se queremos manter nossa amizade o único caminho é o que lhe falei acima: quando sentirmos que fomos tocados em nossas feridas, parar e perguntar o que está acontecendo e colocar isso claramente na conversa para que ninguém saia machucado mais do que seja necessário. Sim, porque sempre vão haver atritos e arestas a serem aparadas entre espelhos que optaram por ter uma convivência pacífica e harmônica . Assim, meu caro, se você quer deixar essa sua amiga de coração aliviado, sempre que eu, sem querer, pisar e você sentir que doeu, me diz, que é pra gente tentar pisar mais manso, ou se for o caso, nem pisar até que você esteja cheio de coragem e disposição para curtir uma dor que, posso lhe garantir, ser o único caminho para se libertar dela e do sofrimento que ela traz consigo. Pense sobre isso tudo que escrevi e veja se é isso que você sente e se acha possível tentarmos nos relacionar dessa forma, ok?
Até outro dia!
Beijos em seu coração!

Liliane Freire

19.5.05

CARTA A UM AMIGO DO CÉU


Se você estivesse conosco completaria nesse 31 de maio sessenta e oito anos. No entanto você se foi há nove anos. Ontem sua presença esteve muito forte comigo e pude sentir o quanto você foi e ainda é importante para mim. Sabe, amigos assim não deveriam nos deixar tão cedo! Eu sinto saudade das nossas conversas onde eu bebia suas palavras e elas enchiam meu coração e maravilhavam meu espírito! Você me via por dentro e sabia do que minha alma ansiava. Vendo-me assim, sabia as sementes que eu carregava e soube regar cada uma delas de forma que elas germinaram e cresceram. Você é um jardineiro da alma. Um talentoso bruxo-jardineiro!
Você via através das máscaras e sorria... Isso me desarmava completamente. Ao mesmo tempo em que me apavorava ser revelada tão intimamente, fascinava-me ver como você fazia isso de forma tão natural apenas lendo cada gesto, cada palavra, cada olhar como se eu fosse um livro que se abria à sua frente e você simplesmente lia!
Dessa forma você fez germinar a sementinha do auto conhecimento com o adubo de seus gestos e a água de suas palavras. Uma vez germinada, essa é uma planta que não para de crescer, florir e dar frutos. Você sabia que eu não resistiria, lançou o seu feitiço e eu quis que ele me pegasse. Esse feitiço mexeu e ainda mexe profundamente comigo. Ah, meu bruxo-jardineiro! Aquelas nossas conversas foram um tesouro valioso que enriqueceram minha alma e mudaram profundamente meu ser. Elas me ensinaram tanto sobre mim, sobre a vida e sobre o sentido de viver! Muitas de suas palavras só agora eu posso realmente compreender, pois só agora amadureci o suficiente para compreender-lhes o significado. Mas você também falou disso. Falou que algumas sementes você estaria plantando e só no tempo certo brotariam e eu me lembraria de você e aí seria a minha vez de sorrir. Mais uma vez você estava com a razão. Sempre que algo assim me acontece e me pego sorrindo lembrando de suas palavras, a impressão que tenho é de que você está ao meu lado com aquele sorriso encantador a dizer: “Eu não disse, filha? Pra que tanta pressa, se somente no tempo certo você entenderia?” Mas é que o mundo que você me apresentava era tudo o que eu ansiava por descobrir e isso me fascinava e, daí, a pressa, a vontade de desvendar mais e mais, me descobrir e descobrir esse universo que eu não sabia existir, mas que era tudo o que eu mais ansiava conhecer.
Obrigada, muito obrigada, por tudo que você me presenteou. Muito do que eu sou agora tem a sua energia. O tempo que você dividiu comigo à sombra da nossa castanhola, as lágrimas que você ajudou a enxugar, o carinho e os conselhos do pai-amigo-mestre, o sorriso maravilhoso que me desarmava, quebrava as barreiras e me aproximava de você....

Embora a saudade seja grande, posso sentir sua presença comigo nas árvores que você semeou e hoje já floriram e deram frutos. Quando fecho os olhos posso lhe ver sorrindo, olhando através dos meus olhos, segurando minhas mãos entre as suas e dizendo: “ Deus a abençoe, minha filha!”
Que Deus o abençoe também, meu Mestre, amigo mais que querido e bruxo-jardineiro!

Muitos beijos em seu coração!
De sua amiga evolutiva,
Liliane